27 de novembro de 2013

forget-me-knot

a quem não me esquece | nós | a quem não esquece | nó | a quem esquece | não | a quem | me | aquém | tu

23 de novembro de 2013

elogio à histérica

o jeito que tens para o sal, a calma que tens para as plantas, a mestria que tens para os filhotes, o frouxo que tens para o riso, o trato que tens para a discórdia, a loucura que tens para o terceiro, o esmero que tens para os ângulos, a pressa que tens para as viagens, a euforia que tens para as notícias, a distância que tens para os amores, a oferta que tens para os amados, o alívio que tens para o retorno, a fé que tens para o sexo, o nojo que tens para o desejo, a festa que tens para a queda, a crença que tens para a Mulher, a recepção que tens para o ódio, a misericórdia que tens para a subida, o amparo que tens para o descanso, a mão que tens para o tapa, o gosto que tens para o adeus.

16 de novembro de 2013

vóz

perguntei uma vez a ela o que é um escritor e o que ele escreve. a resposta foi mais ou menos nos conformes de: o escritor é um homem sensível. não sensível a ponto de ser choroso, mas aberto às sutilezas da vida para as quais pessoas comuns não estão atentas. o escritor escreve qualquer coisa que diga sobre a vida: se ele viu uma injustiça, deve escrever. se ele viu uma coisa simples, deve escrever. se desconfiou de deus, deve escrever. se ficou triste, deve escrever. é como uma compulsão. ele deve escrever para se manter vivo, para sobreviver. como se palavra fosse ar. como se obedecesse a uma ordem, por mais angustiante que seja obedecer sempre. eu não sou escritora. eu sobrevivi para escrever, e não o contrário. meu livro é minha memória. estou pronta para a morte.

3 de novembro de 2013

devaneia o estrangeiro em bruta melancolia deitado confortavelmente em um sofá a desejar tomar chá com quem o ama ou supõe amar imaginando sobre uma possível vida que não acontecerá se não for uma escola ou uma passagem ou um desarranjo de hipóteses formulando cenas cônjuges nas quais

atos cheios de ternura brevemente resumidos em fazer almoços ou jantas felizes e sorrisinhos e suspiros ao fatiar os vegetais ao refogar e cozer os grãos e outros vegetais ao temperar as folhas e juntá-las a uns outros vegetais e ao espremer o suco das frutas ou ao destampar a embalagem plástica do suco industrial e ao questionar a categoria dos vegetais que não se sabem tomates-abóboras-bananas-chuchus-maçãs-alhos-uvas-cebolas-goiabas-vagens-laranjas-quiabos-etc-etc-etc

fins de tarde tristes de programação de tv apocalíptica da globo que seria substituída por uma conversa ao agrado da erudição de nossa preguiça dominicais ou de nossa compulsão à intelectualidade ou de nossa incompreensão acerca da substituição dos objetos de alguma histérica importante em nossas vidas

noites escuras para se dançar um jazz sensual coladinho e que no auge do saxofone haveria uma coreografia destoante pura subversão artística cabível à circunstância que seria tomada como vergonhosa no cotidiano quando na verdade na verdade a vida nossa seria assim só de ridicularidades que o amor faz fazer e que tendo ele passado permaneceria somente a vergonha e os hábitos de refeição televisão e louvor à estupidez.