17 de dezembro de 2013

vóz iii

sobre os prazeres da vida, dizia: não tenho mais. quando eu ainda tinha saúde, fazia o serviço de casa, não me humilhava por conta de empregada. cozinhava, lavava, limpava. não sei se gostava, mas seu avô gostava, então por mim estava bem. mas o tempo passou, os médicos proibiram as poucas alegrias que sobraram. mas o pior foi com a comida. culpa da diabetes. até aquele doutor novo, bonitinho, que me acompanhou por último (levou uma bronca por conta da pressão alta e dos possíveis ataques cardíacos), falou que eu não posso com açúcar. não como mais nada: pão, rosca, pão-de-queijo, arroz, batata, sobremesa: só de vez em quando. café, por exemplo, só com adoçante. mas não contei pra eles que aqui em casa tem uns agrados - e não são só os mineirinhos na geladeira - que são meus e dos netos. deixa eu te mostrar. sobe nessa cadeira pra você ver (apontava para a cadeira próxima à escrivaninha). em cima do armário. (eu subia e pegava um saco cheio de sonho de valsa). acho uma delícia.