15 de setembro de 2013

Cabeça vazia ou Do sonho que nunca terei

(da quadra dos homens que choram, apenas eu poderia tê-lo sonhado: os dois do 'som' estão mortos, o outro se matou na experiência onírica real, e eu prossegui; segue aqui o meu relato fantasmático revertido pela culpa.)
na primeira casa em que morei ao me mudar. tenho, por algum motivo, que ir à casa da vó (ver, talvez, a morte configurada). condição de ida: o suicídio. deliberação: morro e vejo a casa: não morro e permaneço. opto por morrer (e ir): dou-me um tiro ou um lance de guilhotina ou foice ou machado ou uma artéria importante gentilmente cortada. pouco importa o veículo, desde que seja um feito capital. impossível experiência de minha própria morte registrada como um movimento rápido, imperceptível em fatos concretos além da certeza de ter morrido. na dita casa, não permaneceria barrado nos portões trancados a ver as janelas e portas abertas entre os espaços das grades: o infantilismo dos espíritos que atravessam a matéria me permitiria avançar - condição nova e tosca - e lá poderia visitar todos os cômodos, tocar todas as paredes, deixar no chão o rastro de minha língua que persistiu em lamber toda a poeira da memória intacta e chorar a ausência de livros em uma casa de família de grande inteligência.

10 de setembro de 2013

quem roça o sentido sabe que não há sol nem terra nem campo nem pasto nem céu que caiba no desalento duma promessa de salvação que se enuncia falsamente nos encontros que fazem o horizonte entre sol-terra-campo-pasto-céu. quem roça o sentido sabe que não há pessoa nem trabalho nem letrismo certo para ajustar o gado ao gado sem normatizar as vicissitudes do espírito em conformidade com uma lei (no mato tudo é bicho apesar da natureza) mesmo com o passar dos dias a iludir a vida com esse deus temporal. quem roça o sentido sabe que as artes e o sujeito servem ao único propósito de foder com qualquer capacidade de abstração a respeito dos objetos: e aí é que nos perdemos todos numa luta entre o conceito e a história. quem roça o sentido sabe que só se pode ser gente sendo animal pensante mas sem muito decoro porque é preciso confortar a sapiência com uma apreensão do que quer que seja (e assim nasce a sabedoria mais sincera).