3 de maio de 2014

a grávida, elevada ao sagrado da mulher, goza por ser a criminosa mais intangível pela lei. na promessa de ser mãe, encarna o suicídio trasvestido de completude suposta, morte mais romântica que qualquer devoção. ela e seu feto, a santa e a sua virgindade, mostram ao mundo o único incesto autorizado - e, como pagamento desta subversão, escolhe morrer por alguns meses ao instalar um ralo dentro de si. a grávida é vista como a fetichista que guarda sua tara na bolsa, masturbando de modo involuntário sua barriga volumosa com os olhos públicos. temporariamente foragida de toda justiça ainda que encarcerada ao seu destino de mãe, a glória da grávida está contada nos meses de gestação, sucumbindo à tragédia que é, não só nascer para o filhote, mas, para a leoa, parir. a partir de então, os dias da grávida (nova mãe) serão marcados pelos desafios e pelas ambivalências (quando não pelo arrependimento) da maternagem e pela solução errada em sua tentativa de resolver a equação de feminilidade e maternidade. daí que, obscenidade lógica levada ao extremo, a única demonstração de amor objetal puríssima de uma mãe para com seu filho é não concebê-lo: se o concebe, é por um (in)feliz engodo: escolha espontânea e/ou forçada, absoluta e/ou individual.